FIDEDIGNO E INDEPENDENTE
O Pianista no Bordel,
de autoria do jornalista espanhol Juan Luis Cebrián, além de leitura
cativante proporciona alguns momentos de reflexões a respeito do
comportamento ético daqueles que se propõem a exercer o papel de
jornalista. Decano do jornalismo espanhol moderno, Cebrián de forma
sintética e esclarecedora leva o leitor a refletir e a entender melhor a
importância da imprensa desde seus primórdios aos dias atuais.
A sua tese é a de que mais do que nunca o jornalista deve ir além
do simples registro dos fatos, pois “a notícia só terá validade se
cumprir os princípios de veracidade, verificação, independência,
compromisso público e lealdade para com o leitor”.
A relação da imprensa com a democracia e seu papel de fiadora da
liberdade de expressão e a encarniçada luta do jornalista contra o poder
político, também é tratada de forma didática e apaixonante. Para
Cebrián, o jornalista moderno tem “que vencer um novo tipo de censura
que não tem origem em pressões externas, mas na própria sociedade
midiática, cujos interesses econômicos nem sempre coincidem com a
apuração da verdade e com a livre circulação da informação”.
Destaca que “o jornalismo de hoje, incluídas as transformações
propiciadas pela internet, continua a ter alguns princípios básicos que
não somente o identificam como profissão, mas também constituem um
compromisso daqueles que o exercem. Afastar-se deles equivale a desertar
da própria condição de jornalista”. Eis os pontos fundamentais:
1. A primeira obrigação do jornalismo é a verdade.
2. Sua principal lealdade é para com os cidadãos.
3. Sua essência é a disciplina da verificação.
4. Seus profissionais devem ser independentes dos fatos e das pessoas sobre as quais informam.
5. Deve servir como um fiscalizador independente do poder.
6. Deve oferecer-se como tribuna para as críticas públicas e para o compromisso.
7. Deve se esforçar para fazer do que é importante algo de interessante e oportuno.
8. Deve seguir as noticiais de forma ao mesmo exaustiva e proporcional.
9. Seus profissionais devem ter direito a trabalhar conforme lhes dita a consciência.
Deixa antever que estes nove mandamentos se resumem facilmente em dois: “o jornalismo deve ser fidedigno e independente”.
Esclarece que ser fidedigno “significa que os jornalistas devem
contar os fatos tal como ocorreram ou, no mínimo, esforçar-se nesse
sentido. Não devem manipular dados, nem destacá-los segundo suas
conveniências; devem ser rigorosos na verificação, exaustivos nas
provas, plurais nos pontos de vista, minuciosos nos matizes, e,
sobretudo, devem saber reconhecer seus erros e seus equívocos e se
dispor a pagar por eles”.
Quanto à independência “equivale a exercer o papel social que seu
ofício pressupõe, a não administrar a verdade apurada segundo as
conveniências ou pressões do poder, a não misturar as próprias opiniões
ou interesses pessoais com os dos leitores, a não trocar sua condição
primária de testemunha pela de juiz, a ser crítico, amante do debate,
polêmico e brilhante sem que a paixão pelas palavras o afaste da paixão
primordial pela verdade, usando as primeiras para iluminar a última com
luz melhor e mais forte”.
Chama a atenção para um tema bastante controverso e é cáustico
quando diz que “os jornais e aqueles que se dedicam a fabricá-los mantêm
relações tradicionalmente muito mal ajustada não só com o poder
político, mas com o poder em geral, em todas as suas manifestações, e
frequentemente são maltratados por aqueles que desconfiam da moral de seus procedimentos.
O pior é que alguns acreditam que “a imprensa é o quarto poder”,
frase que fez história e que nos persegue como fantasma. Pior ainda, é
que alguns acreditam nela e se esforçam muito para lhe dar veracidade,
tentando governar a partir das páginas dos jornais e exercendo todo tipo
de pressões, manipulações e até chantagens sobre as diversas instâncias
sociais, para que se comportem de acordo com as manias ou interesses
dos que dirigem os jornais.
Cebrián é categórico ao dizer que seria absurdo negar que a
imprensa representa algum tipo de poder. Mas, há quem insista em dizer
que “se trata efetivamente de um verdadeiro poder, com enorme capacidade
de destruição: talvez não possa erigir governos, mas pode derrubá-los;
talvez não possa consolidar famas, mas suas potencialidades de difamar e
insultar são quase ilimitados”.
Sem me permitir a entrar em outros detalhes bem argumentados por
Cebrián, apenas sinto-me tentado a transcrever um trecho em que ele cita
Kierkegaard, pai do existencialismo, quando costumava se queixar
asperamente: “Se não fosse a imprensa, ousaria confiar em minhas
próprias forças: mas é horrível que a cada semana ou a cada dia um único
homem possa fazer com que, num instante, 40 ou 50 mil pessoas digam e
pensem exatamente a mesma coisa”.
Para fechar: “Se Cristo voltasse ao mundo, Ele não teria como adversários os Sumos sacerdotes, mas os jornalistas”.
Mas, existe um alento: trabalhar é pior!
Fonte: Chico Pinto
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