Nilda destaca apelo de Luiz Gonzaga contra a seca e diz que problema começou ainda no século XVI
Em
pronunciamento sobre o sofrimento das populações do semiárido nordestino
em razão dos períodos de seca prolongada, a deputada federal Nilda
Gondim (PMDB-PB) destacou, na tribuna da Câmara dos Deputados, a
histórica falta de vontade política dos governantes brasileiros no
sentido de proporcionar soluções viáveis e efetivas para o problema.
Aproveitando o período junino, em que os Estados nordestinos comemoram o
centenário de nascimento do cantor e compositor Luiz Gonzaga (o
inesquecível “Gonzagão”), que nasceu na cidade
de Exu, no Estado de Pernambuco, no dia 13 de dezembro de 1912, e
morreu no dia 02 de agosto de 1989, poucos meses antes de completar 77
anos, Nilda Gondim lembrou que, por meio de sua música, Luiz Gonzaga
descreveu o sofrimento do homem nordestino e a sua luta para superar os
efeitos das estiagens prolongadas e implacáveis.
Em “Asa Branca”, por exemplo, ela destacou duas estrofes que mostram com
maior riqueza de detalhes a realidade das vítimas da seca. A primeira
diz textualmente o seguinte: “Quando olhei a terra ardendo, / Qual fogueira
de São João, / Eu perguntei a Deus do céu, / Por que tamanha
judiação?”. E a segunda complementa: “Que braseiro, que fornalha, / Nem
um pé de plantação. / Por falta d'água, perdi meu gado, / Morreu de sede
meu alazão”.
“Como podemos constatar – comentou a deputada –, a música ‘Asa Branca’,
composta por Luiz Gonzaga, em parceria com o compositor e instrumentista
Humberto Teixeira, e gravada em 1947, já mostrava, naquela primeira
metade do século XX, um quadro desolador e cruel que poderia muito bem
ser resolvido por meio de investimentos públicos capazes de redistribuir
a grande riqueza hídrica de que dispõe o Brasil, mas que, há época,
encontrava-se concentrada em algumas regiões e inteiramente escassa em
outras, especialmente no Nordeste”.
“Passados mais de 65 anos do dia 03 de março de 1947, quando Luiz
Gonzaga entrou nos estúdios da RCA para gravar ‘Asa Branca’
(posteriormente consagrada como sendo o ‘Hino do Nordeste’), o quadro de
falta d’água, de pobreza e de morte do gado e dos ‘pés de plantação’
descrito pelo ‘Rei do Baião’ continua vivo e igualmente implacável em
toda a região nordestina”, continuou Nilda Gondim. Acrescentando que não
são apenas estes 65 anos que separam a gravação de “Asa Branca” dos
dias atuais que marcam o sofrimento das populações do semiárido
nordestino por causa das estiagens prolongadas, ela observou que o
problema data ainda do século XVI, época em que os portugueses chegaram
ao Brasil.
Segundo a deputada, foi daquele século uma das primeiras secas de que se
tem notícia e que teria acontecido entre os anos de 1580 e 1583.
Naquele período, segundo dados históricos disponibilizados na literatura
especializada, as capitanias tiveram seus engenhos prejudicados; as
fazendas sofreram com a falta de água, e cerca de cinco mil índios
desceram o Sertão em busca de comida.
“Assim como no semiárido brasileiro de hoje, a seca já apresentava, nos
anos 1500, efeitos assustadores como miséria, fome, sede, epidemias e
migração desenfreada. No século seguinte, as populações indígenas deram
lugar aos chamados ‘sertanejos’,
que passaram a ocupar a região conhecida como o Polígono das Secas,
área que compreende parte dos Estados de Alagoas, Bahia, Ceará, Paraíba,
Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe, além do Norte de Minas
Gerais”, informou Nilda Gondim.
“Nos anos 1700 – acrescentou –, diversas estiagens atingiram a região,
provocando a morte de rebanhos, homens, mulheres e crianças, vitimados
pela fome que se espalhou de forma acelerada. No século seguinte a
região sofreu com chamada ‘Grande Seca’, iniciada em 1877. O fenômeno
durou pouco mais de dois anos; provocou doenças, fome e sede em escala
suficiente para dizimar centenas de milhares de habitantes, e introduziu
no cenário brasileiro a figura do ‘retirante’ – famílias pobres e
castigadas pela seca que se viram obrigadas a migrar para os grandes
centros urbanos
em busca de sobrevivência”.
Após esse período, segundo ressaltou a deputada paraibana, as
autoridades do Império começaram a demonstrar uma maior preocupação com o
assunto, tendo o imperador D. Pedro II chegado a afirmar que, mesmo que
fosse necessário gastar a última jóia da Coroa, nenhum nordestino
morreria de fome.
“Por iniciativa do imperador, foi criada a comissão imperial para
desenvolver medidas que pudessem atenuar futuras secas, dentre as quais a
construção de ferrovias e açudes e a abertura de um canal para levar
água do Rio São Francisco para o Rio Jaguaribe, no Estado do Ceará”,
comentou Nilda Gondim.
“Apesar da demonstrada determinação e preocupação imperial, entretanto,
muito pouco saiu do papel. E o nordestino continuou convivendo com secas
intermináveis e cada vez mais trágicas, dentre as quais a de 1915,
quando milhares de retirantes morreram de fome e de sede, e a de 1932,
quando ficou conhecida a chamada ‘indústria da seca’, em que as
oligarquias econômicas e políticas da região passaram a utilizar os
recursos do governo em benefício próprio, com o pretexto de combater as
mazelas do fenômeno climático”, acrescentou.
Outras secas atingiriam o Nordeste nas décadas seguintes. A mais
abrangente delas, segundo a deputada Nilda Gondim, teve início em 1979 e
durou quase cinco anos. Fome e saques se espalharam pela região.
Estima-se que não houve colheita em nenhuma lavoura dentro de uma área
de 1,5 milhões de quilômetros quadrados. E dados oficiais dão conta de
que, nessa época, morreram 3 milhões e 500 mil pessoas por conta de
enfermidades e desnutrição.
“De lá pra cá, o fenômeno voltou a se repetir com mais intensidade nos
anos de 1993, 1998 e 2001. E a cada ano que passa aumenta o sofrimento
da população”, enfatizou.
Assessoria